Artigo

Aconselhar não é blá-blá-blá

Muito embora o aconselhamento tenha um caráter mais diretivo, o conselheiro cristão deve evitar a precipitação de falar o tempo todo. É importante que tenha gravado em sua mente as palavras do sábio: “Responder antes de ouvir além de tolice é pura grosseria” (Pv 18.13 - Bíblia Mensagem). A principal ação do conselheiro cristão precisa ser escutar, escutar e escutar.

 

Já atendi algumas pessoas que chegaram ao gabinete pastoral muito mobilizadas emocionalmente e falaram por mais de uma hora a fio. Em algumas dessas ocasiões, a minha atitude foi ouvir empaticamente e orar no final. Tempo depois, já ouvi as seguintes palavras de algumas dessas pessoas: “pastor, muito obrigado por suas palavras naquele aconselhamento”. Digo pra mim mesmo: “Mas eu não falei nada” (rs). O poeta e escritor francês Pierre Marivaux (1688 - 1763) disse que: “Saber ouvir quase que é responder”.

 

Cito mais uma vez o sábio, quando ele diz: “Tens visto um homem precipitado no falar? Maior esperança há para um tolo do que para ele” (Pv 29.20). Etimologicamente a palavra precipitação vem de precipício: abismo, perdição, ruína. Heródoto, importante historiador grego, disse que “a precipitação é a mãe do fracasso”. Quantos aconselhamentos fracassam justamente pela precipitação do conselheiro em falar antes de escutar. O que quero ressaltar e enfatizar aqui é que o aconselhamento não é blá-blá-blá. Afirmo, sem medo de errar, que o conselheiro que não sabe escutar não está preparado para aconselhar.

 

Mas em que reside a dificuldade do conselheiro em escutar o que o outro tem a dizer? Em alguns casos na falta de preparo e orientação adequados. Alguns conselheiros acham de modo totalmente equivocado que precisam dar uma resposta certeira para todo e qualquer problema que lhe é apresentado. Por isso, ficam presos aos detalhes concretos da fala do aconselhado, deixando de lado a escuta empática.

 

Mas a falta de preparo não é uma questão meramente técnica. Pode ser uma questão inerente à vida emocional do conselheiro, que num movimento inconsciente acaba embolando a história pessoal com a história apresentada pelo aconselhado. Quando os conteúdos emocionais do conselheiro se misturam com os conteúdos emocionais do aconselhado, ele acaba falando de modo compulsivo, sem se dar conta disso. Tal atitude acaba prejudicando o aconselhamento e em alguns casos a melhor decisão é não continuar.

 

Um outro aspecto muito importante a ser considerado é o esgotamento emocional por parte do conselheiro. Ainda mais no caso do pastor, que em geral escuta muitas pessoas, mas não busca um espaço para ser escutado. Ǫuem só escuta o outro, mas não é escutado, torna-se pesado e sobrecarregado emocionalmente. Infelizmente, muitas pessoas e profissionais que atuam em áreas assistenciais acabam desenvolvendo a síndrome de burnout, ou síndrome do “fósforo queimado”, por se doarem tanto esquecendo-se de si mesmas.

 

É preciso ter em mente que o ato de aconselhar envolve reafirmar a importância crucial da escuta empática e da preparação emocional do conselheiro, especialmente em contextos cristãos e pastorais. O aconselhamento é um exercício de humildade e paciência, em que o conselheiro cristão deve priorizar a escuta atenta sobre o impulso de oferecer respostas imediatas. É ouvir atentamente reconhecendo que uma ajuda efetiva só pode ser alcançada através da empatia e da compreensão profunda do outro.