No dia 20 de outubro de 1987, fui consagrado ao ministério, em concílio realizado na Primeira Igreja Batista em Lins - RJ. O presidente do concílio foi o pastor Vitor Hugo Mendes de Sá, um grande amigo até hoje. No final desse mesmo ano fui convidado para assumir o ministério pastoral na Igreja Batista Filha de Sião, onde vivi aproximadamente dez anos extremamente abençoados.
Mas o meu objetivo aqui não é falar da minha “carreira” ministerial, mas sim destacar uma conclusão que chego em relação a todo esse tempo de ministério, no que diz respeito à ênfase que durante todos esses anos vi em relação à capacitação dos pastores, através de congressos e seminários, com foco, na grande maioria das vezes, no crescimento da Igreja.
Não posso negar que tendo participado de muitos congressos e seminários de líderes aprendi muitas coisas boas. Mas com o passar do tempo observei que o que é bom para um, não é, necessariamente, bom para outro. Cada caso é um caso, cada pastor é um pastor e cada Igreja é uma Igreja, dentro de um contexto geográfico, histórico e cultural. Isso sem falar que o vento, enquanto símbolo do Espírito Santo, sopra onde quer. Ou seja, o crescimento da Igreja tem mais a ver com Deus do que com o pastor, por mais sincero, competente e piedoso que ele seja.
Um aspecto muito importante que precisamos considerar e ter sempre em mente é que a pessoa antecede a estrutura, e toda e qualquer estrutura surge a partir das pessoas. Nesse sentido, a estrutura deve ser usada como forma de promoção e não de escravidão da pessoa. Mas, em quantas ocasiões pastores e líderes estão sendo consumidos espiritualmente, emocionalmente, fisicamente e familiarmente por conta de uma estrutura eclesiástica que assumiu primazia em relação a ele e às demais pessoas que a constituem? Isso não é bom. Não é saudável. É doentio.
No livro “O curador ferido - Ministério na sociedade contemporânea”, Henri Nouwen faz uma crítica muito profunda no que diz respeito à prática de muitos ministérios hoje, dizendo que:
É um fato efetivamente doloroso perceber o quão mal preparados a maioria dos líderes cristãos se revelam quando eles são convidados a serem líderes espirituais no sentido verdadeiro. A maioria está acostumada a pensar em termos de organização de grande escala, reunir pessoas em igrejas, escolas e hospitais e comandar o show como diretores de circo. (2020, Ed. Vozes, p. 57)
É duro ouvir uma crítica como essa. Confesso que em algumas vezes, no decorrer desses trinta e sete anos de ministério, eu já me senti como um animador de circo.
Para Nouwen, a principal característica de líderes cristãos do futuro é a compaixão. Ele diz:
A compaixão deve se tornar o núcleo e até a natureza da autoridade. Os líderes cristãos são pessoas de Deus apenas na medida em que são capazes de tornar a compaixão de Deus pela humanidade – que é visível em Jesus Cristo – plausível no próprio mundo delas. (Op Cit., C1)
Se concordamos com Nouwen, que os líderes cristãos do futuro precisam ter a marca da compaixão, então precisamos entender que pastores são homens que choram, que cansam, que desanimam… e que muitas vezes são pressionados a continuar sorrindo como se fossem máquinas do Sagrado, movidos pela produção e não pela compaixão.
O pastor, como líder, não deve ser visto como se fosse uma máquina. Mas, como um homem de carne e osso – alguns com mais carne do que osso, outros com mais osso do que carne (rsrs). Não como uma máquina que precisa de manutenção, mas como uma pessoa que precisa de cuidado. Antes de ser um líder, o pastor é um ser humano em construção como qualquer outra pessoa.
Por isso, ouso dizer de modo muito enfático, mas também muito respeitoso: já passou da hora de pararmos de transformar pastores, em máquinas de produtividade eclesiástica. Chega de exigir performance espiritual de quem por conta do excesso de trabalho e compromissos acaba desenvolvendo uma depressão e já não tem forças sequer para orar. Chega de fabricar resultados à custa da saúde emocional dos pastores.
Se quisermos Igrejas fortes, precisamos de pastores inteiros. Se quisermos estruturas saudáveis, precisamos de almas bem cuidadas. E se quisermos ministérios duradouros, precisamos, urgentemente, devolver ao pastor o direito de ser gente. Pois antes da igreja, há o homem. Antes do púlpito, há o quarto secreto. Antes do sermão, há o joelho ferido. E antes da estrutura, há o ser.