Artigo

A sorte do pessimista

Imagine esta situação: uma jovem de aproximadamente 25 anos, filha única, solteira, cristã, morando com os pais. Ela trabalha de dia e faz faculdade à noite. Sua rotina semanal é: casa – trabalho – faculdade – casa; uma rotina com horários bem ajustados.

 

Uma noite, no entanto, essa jovem passa uns trinta minutos do horário convencional de chegada em casa, após a faculdade. Por conta disso, sua mãe fica agitada, imaginando coisas terríveis que poderiam estar acontecendo com a filha. A mãe liga, mas a filha não atende. Envia mensagens, mas não recebe resposta. O desespero aumenta. Ela liga para a faculdade e é informada de que a última aula da filha terminou há mais ou menos duas horas. O desespero da mãe cresce e os pensamentos trágicos também.

 

O pai da jovem também tem um rito: chega em casa, toma banho, janta, deita no sofá para ver televisão e dorme ao ponto de ressonar. Dominada pela emoção, a mãe acorda o esposo, dizendo:

 

— Acorda, homem! Nossa filha ainda não chegou da faculdade. Ela não costuma se atrasar. Estou muito nervosa! Será que foi assaltada? Sequestrada? Violentada? Atropelada?

 

O esposo, ainda embriagado pelo sono, olha para o relógio e responde:

 

— Calma, mulher! Por que todo esse desespero? Não aconteceu nada. São só trinta minutos de atraso. Vai ver que o ônibus atrasou. Calma! Daqui a pouco ela chega.

 

A esposa, cada vez mais agitada, retruca:

 

— Não sei como você pode ficar tão calmo! Troque de roupa e vamos fazer alguma coisa! Vamos à delegacia, aos hospitais, ao IML!

 

Mas, de repente, click, a porta da sala se abre e a filha entra. Ao ver a mãe chorando e nervosa, ela fica assustada e pergunta:

 

— O que foi que aconteceu? Quem morreu? Foi a vovó? O vovô?

 

Pensamentos negativos criam uma cultura negativa, que sempre acaba entranhando na vida das pessoas do mesmo círculo social. Diante de duas mulheres desesperadas, o pai responde:

 

— Você sabe como sua mãe é. Por que não ligou avisando que se atrasaria?

 

A filha responde:

 

— O ônibus demorou. Eu ia ligar, mas a bateria do celular estava descarregada. Não aconteceu nada, só me atrasei trinta minutos.

 

Essa história melodramática não é o relato de nenhum caso clínico; é pura invenção da minha cabeça. Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência. Inventei essa história para destacar que a sorte dos pessimistas é que a maioria dos pensamentos fatídicos que brotam em sua mente não se cumpre. Graças a Deus por isso! Na verdade, se se cumprissem, já estariam fritos, torrados e, por que não dizer, mortos.

 

Esse raciocínio lógico seria mais do que suficiente para combater os pensamentos negativos e pessimistas. Mas, na prática, não é assim. Isso porque pensamentos negativos e pessimistas são impermeáveis à razão. Tentar convencer um pessimista por meio de argumentos lógicos é uma ação infrutífera. O pessimista é dominado pela emoção, que sempre acaba sequestrando a razão. Daí a expressão: “Não sei como fiz isso. Fiquei cego.”

 

Por vezes, na luta para provar que o pessimista está errado, o otimista acaba cedendo à lógica ilógica do pessimista. Como diz a frase: “Um pessimista derruba facilmente um otimista. Mas cinco otimistas não conseguem levantar um pessimista.”

 

Por não ser uma questão atrelada à razão, não podemos dizer que uma pessoa pessimista escolhe ser pessimista. O pessimismo é fruto de uma mente mobilizada por emoções negativas, geradas por vivências e experiências traumáticas não elaboradas, que facilmente se conectam a novas experiências, mesmo quando não têm relação com as anteriores. A frase que domina a mente do pessimista é: “Eu já vi esse filme antes.”

 

No livro Inteligência Emocional, Daniel Goleman demonstra de modo muito claro como as emoções podem embotar, distorcer e sequestrar a razão. Ele diz:

 

“A mente emocional é muito mais rápida que a racional, agindo irrefletidamente, sem parar para pensar. Essa rapidez exclui a reflexão deliberada, analítica, que caracteriza a mente racional.” (2012, Ed. Objetiva, p. 305).

 

Assustado com a vida, o pessimista sofre antes do tempo, o que o leva a sofrer o tempo todo. No Salmo 42, o salmista ilustra a ligação catastrófica do pensamento pessimista, dizendo:

 

“Um abismo chama outro abismo, ao ruído das tuas cachoeiras; todas as tuas ondas e vagas passaram sobre mim.” (Sl 42.7).

 

O pensamento pessimista é uma forma de aprisionamento nos labirintos da mente. Na mitologia grega, o labirinto foi construído por Dédalo para prender o terrível Minotauro. Todos os que eram lançados no labirinto morriam cansados, sedentos e famintos pelos corredores sem saída ou eram devorados pelo terrível monstro.

 

A ligação contínua dos pensamentos negativos causa exaustão e consome a vida do pessimista. Mas isso não significa que ele esteja fadado a tão triste sorte.

 

Ainda no mito do labirinto, encontramos a história de Teseu, um herói ateniense admirado que venceu o Minotauro. O nome de Teseu significa “homem forte”, mas sua vitória não se deu por sua força, e sim pelo fio de amor concedido pela jovem Ariadne. Esse fio, depois de matar o Minotauro, permitiu que Teseu encontrasse a saída do labirinto.

 

O que ajuda o pessimista a encontrar a saída dos labirintos mentais que o aprisionam não são conselhos, mas sim uma escuta empática, que permite que, ao discorrer sobre os pensamentos pessimistas que o atormentam, ele acabe encontrando uma saída.

 

Essa escuta empática é muito difícil para aqueles que estão emocionalmente ligados ao pessimista, pois há uma reverberação emocional que frequentemente gera conflitos. A fala purga as emoções. A fala cura.

 

Foi falando do que sentia que o salmista termina o Salmo 42, dizendo:

 

“Por que estás abatida, ó minha alma? Por que te perturbas dentro de mim? Espera em Deus, pois ainda o louvarei, a ele, meu auxílio e meu Deus.” (Sl 42.11).

 

Em vez de combater o pensamento negativo do pessimista, permita que ele fale. Ao dar vazão às suas emoções e medos, os pensamentos pessimistas podem ser desconstruídos.

 

Se a sorte do pessimista é que a maioria dos pensamentos negativos que alimenta não se cumpre, o azar, se podemos dizer assim, é que, ao tentar se prevenir do pior, ele acaba vivendo um sofrimento sem fim. Sua mente está sempre presa a cenários trágicos e sombrios, que tiram sua paz e sua alegria no presente.

 

Como bem diz o texto de Provérbios:

 

Para quem vive aflito, todos os dias são maus, mas a vida de quem tem o coração alegre é uma festa contínua.” (Pv 15.15).