Artigo

Definir x decifrar

Nem sempre o conhecimento de um conceito é suficiente para solucionar um problema. Isso porque, além do conceito em si, há um fenômeno que precisa ser examinado e analisado com atenção. Por exemplo, no mito grego da esfinge, todo viajante só poderia adentrar na cidade de Tebas se conseguisse decifrar o seguinte enigma: “Qual animal tem quatro patas pela manhã, duas à tarde e três à noite?”. A punição para quem não conseguisse resolver o enigma não era simplesmente abandonar seus planos e voltar para casa, como ocorre atualmente quando alguém é barrado pela imigração e precisa retornar ao seu país de origem. No mito, o viajante que tentasse entrar em Tebas sem decifrar o enigma era devorado pelo monstro. Daí a famosa inscrição: “Decifra-me ou te devoro”.

 

A resposta para o enigma da esfinge de Tebas é aparentemente simples: o homem, que, quando criança, engatinha, na vida adulta anda sobre dois pés e, na velhice, necessita de uma bengala. No entanto, estamos enganados se pensarmos que essa resposta aponta apenas para uma simples definição das etapas da vida. A vida não é um enigma que clama por uma definição, mas um enigma que exige ser decifrado. Definir e decifrar são coisas distintas. Definir é uma forma de limitar, enquadrar, emoldurar e encerrar uma questão. Definir é esgotar o sentido daquilo que está sendo definido.

 

Isso é claramente observado no chamado de Moisés. Quando ele pergunta o nome de Deus — educado no Egito e culturalmente acostumado com definições — a resposta que recebe é: “Eu sou o que sou”. Decifrar não é o mesmo que definir. Decifrar é descobrir. Ao descobrir algo, não estamos necessariamente definindo-o, mas conhecendo algo novo sobre ele. Se fosse possível definir Deus, saberíamos tudo sobre Ele, o que é obviamente uma impossibilidade. Nós conhecemos Deus de uma forma inexplicável, não limitada pela razão humana. E é justamente essa realidade que confunde os sábios, que para crer precisam ver, tocar, definir. Deus não é para ser definido, mas para ser descoberto. Ele precisa ser decifrado dia após dia, não limitado a uma definição em um único momento. Deus não é para ser dissecado, mas vivido e experimentado ao longo da vida.

 

Como criaturas feitas por Deus e portadoras de Seu fôlego divino, também não podemos ser completamente definidos ou rotulados. Eu e você não somos apenas o que pensamos ser, tampouco o que os outros dizem que somos. Há inúmeras descobertas que revelam um vasto leque de possibilidades dentro de cada um de nós. E isso não se trata apenas de nós, existencialmente falando, mas dEle. É mérito Dele. Melhor dizendo: é Graça dEle. A palavra “entusiasmo” vem do grego e significa “Deus dentro de nós”. Penso que isso nos ajuda a entender que, na vida, definir é diferente de decifrar..